Quarta-feira, 05 de Dezembro de 2012

Ainda em Goiânia. Caxito havia recebido uma proposta de trabalho e podiam muito bem ter ficado por lá, onde haviam sido muito felizes e tinham importantes e leais amigos. Contudo, ainda na distante Lisboa, Caxito assumira um compromisso com Adélia. Se ambos já sabiam da enorme empatia que os ligava um ao outro; os mesmos gostos, as mesmas causas, os mesmos pensamentos e a mesma forma de encarar a vida. Ambos educadores. Ela aposentada e professora de história. Ele animador desportivo e sócio cultural. Mas a cada dia que passava descobriam mais e mais afinidades entre si, a ponto de se mostrarem em algumas ocasiões estupefatos e incrédulos com tais afinidades que descobriam a todo o instante.

Levita, filha de Adélia, vivia em Lucas do Rio Verde com o seu companheiro, dois filhos dele e um dos filhos dela, Matthew. E este era portador de déficit comportamental e hiperatividade. E tal estava dando origem a alguns problemas familiares. Havia esperança que a experiência de ambos, como educadores, em especial o Caxito, mercê do seu trabalho no projeto Para Ti Se Não Faltares, habituado a lidar com crianças e jovens em situação de risco, pudesse servir para ajudar na melhoria do relacionamento dele no seio familiar. Por outro lado, partiram também com a promessa de um emprego para o Caxito que já enviara o seu currículo e segundo afirmavam era garantido, a APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais, de Lucas do Rio Verde estava só esperando a sua chegada e ansiosa por tê-lo como colaborador. Tal até motivou alguma reticência em Caxito. Era apenas um monitor que dava o melhor de si e não um salvador da pátria. Em primeiro lugar, há que definir o que são crianças hiperativas e com déficit comportamental? Muitos defendem que isso não passa de uma modernice para rotular os meninos mal comportados e com má educação. Não é verdade. Nem sempre os meninos que apresentam problemas de comportamento são crianças com déficit comportamental e hiperatividade. Por vezes são mesmo meninos com má educação e muito mau comportados. Há que saber definir as situações. Mas é inegável que a hiperatividade e o déficit comportamental são um fato. E que afeta muitas crianças e mesmo até adultos.

São os casos em que se constata que desde pequeno já é inquieto. Em casa, corre daqui para lá o dia todo, sem que nada o detenha, nem sequer o perigo. Tira brinquedos de seu lugar, espalha todos pelo chão e, quase sem usá-los, pega outros e outros. Interrompe permanentemente os adultos e as outras crianças, respondendo impulsivamente e de forma exagerada àqueles que o aborrecem. Seus companheiros de escola o evitam, mesmo assim ele sempre termina chamando-os para pedir ajuda nas lições que não consegue copiar a tempo.

Os sintomas acima mostram a vida de uma criança que apresenta um dos transtornos mentais mais freqüentes nas crianças em idade escolar, a Hiperatividade, ou Transtornos de Déficit de Atenção por Hiperatividade (TDAH), como é chamada pelos especialistas.

Ainda é comum encontrar entre leigos, a noção de que a criança hiperativa seja apenas malcriada, ou mal educada pelos pais. Por isso, é importante que os pais prestem muita atenção nas atitudes e comportamentos dos filhos, seja dentro de casa, na rua ou na escola.

A diferença entre uma criança que tenha hiperatividade de outra mal educada é que a segunda não apresenta alguns distúrbios como perda relativa de visão ou audição, problemas de comunicação, estresse emocional, convulsões e distúrbios do sono, que são mais comuns na primeira, além do mau humor constante.

O verdadeiro comportamento hiperativo interfere na vida familiar, escolar e social da criança. As crianças hiperativas têm dificuldade em prestar atenção e aprender. Como são incapazes de filtrar estímulos, são facilmente distraídas e tendem a ser muito agarradas às pessoas, necessitando de muita atenção.

É importante para os pais perceberem que as crianças hiperativas entendem as regras, instruções e expectativas sociais. O problema é que elas têm dificuldade em obedecê-las. Esses comportamentos são acidentais e não propositais. Por isso, não se devem culpar essas crianças por serem assim, isso só será pior para elas.

Para garantir que a criança realmente hiperativa seja tratada adequadamente, e evitar o tratamento inadequado de uma criança normalmente ativa ou malcriada, é importante que se perceba com precisão o que está na base desse comportamento anormal e só o médico estará em condições de esclarecê-lo, pois é necessário receber um diagnóstico preciso.

Pais, professores e outros educadores que se proponham trabalhar com essas crianças terão de se preparar e ter o conhecimento suficiente que lhes possibilite descrever, de forma precisa e objetiva, o comportamento da criança em casa, na escola e nas atividades sociais. Se ela está encontrando dificuldade na escola, peça-se ao professor que converse com o médico ou envie-lhe um relatório por escrito. O mesmo para monitores e outros educadores que com ela trabalhem.

Ao tratar da criança hiperativa, sua meta é ajudá-la a fazer o melhor possível, em casa, na escola, e com os amigos. Lembrem-se sempre de essas crianças estão lutando com todas as forças para superar uma deficiência do sistema nervoso. Que os pais o expliquem se preciso for, mas não se sintam envergonhados ou culpados quando seus filhos não se comportarem bem.

Voltando ao Caxito e Adélia, sua chegada a Lucas do Rio Verde foi saudada com entusiasmo, em especial, para filha e mãe, com a felicidade de puderem matar a saudade. Caxito foi excepcionalmente bem recebido, tanto pela enteada como pelo companheiro desta, Tavinho.

No entanto, cedo se percebeu que aquela família atravessava um período de forte turbulência. Os filhos de Tavinho estavam em conflito aberto com a companheira de seu pai e Matthew, era hostilizado por aqueles. A economia familiar ressentia-se do desperdício familiar. Os filhos de Tavinho; se sobrava refrigerante da refeição anterior, mesmo que a garrafa estivesse praticamente cheia, ia fora e comprava-se outra. Naquela família reinava um clima de guerra fria evidente. Mas porque há que ser justo, os filhos de Tavinho sempre se comportaram de forma educada e receberam bem Adélia e o esposo.

Mas o mais importante naquele preciso momento era perceber onde colocar Matthew, entre o grupo dos meninos mal educados e mal comportados, ou no das crianças hiperativas e com déficit comportamental?

Cedo se percebeu que a situação divergia em muito do que o casal contava encontrar naquela cidade. Para começar, a tão anunciada colocação para Caxito não existia e nem sequer houvera qualquer contato nesse sentido. Tavinho, era um homem eminentemente otimista e fazia mil e um projetos de investimento em que havia a garantia de fabulosos lucros a curto prazo e passava essas idéias para Adélia e Caxito. Felizmente a situação financeira e os recursos de ambos os colocavam ao abrigo desta crise inesperada e podiam facilmente sobreviver e bem, sem o tal emprego imediato. Não se julgue que Tavinho era um mentiroso por natureza. Não o poderemos considerar. Tinha um comércio como representante de um fabricante de piscinas e encarava a vida, com demasiado otimismo. Uma boa idéia que pensasse ter logo era abraçada pela análise das perspectivas de lucro e pensando que tudo iria dar certo, sem a existência de contratempos. Assim, não ponderava convenientemente os fatores, favoráveis e desfavoráveis, movendo-se pelo entusiasmo dos animadores lucros e sendo imprudente. Assim era na sua vida e isso lhe causava com freqüência dissabores nos seus negócios. Assim procedia perante as visitas e também é preciso que se diga a verdade, ele desejava verdadeiramente que Adélia e Caxito se radicassem em Lucas do Rio Verde, se estabelecessem sendo donos do seu próprio negócio e triunfassem.

Entretanto um grande desgosto vem ensombrar a felicidade e desestabilizar a saúde de Adélia. O casal optou por alugar uma casa em Lucas do Rio Verde e pelo menos por uma temporada, permanecer nesta, até se aquilatar as possibilidades de trabalhar com Matthew. Ao procurar e encontrada a casa, o aluguer se tornara inviável por Adélia ter o seu nome no Serasa. Desconhecia este fato. Ficou aí, a saber, que seu filho Nil a ludibriara e utilizara como avalista na compra de uma moto cujos compromissos não honrava. Conseguira fazê-lo sem Adélia se aperceber desse fato. Tal situação provocou uma grave crise em Adélia, com a pressão a atingir níveis muito perigosos e colocar algum risco para a sua vida. Aqui,  Caxito tomou pela primeira vez conhecimento de que aquele elemento da família era de caráter duvidoso, no que toca ao seu relacionamento familiar. Aqui e ali já ouvira alguns comentários que indicavam nesse sentido, mas era a primeira prova de alguma veracidade dos mesmos. A situação acabou por se resolver, alugou-se outra casa e o casal assentou arraiais em Lucas.

O trabalho com Matthew revelou-se difícil. Este não tinha nenhuma noção do que era comportar-se e ter normas a que obedecer. Problemas; já arranjara e muitos. Na escola estava à beira da exclusão. Na Igreja, havia já sido excluído. Aqui Caxito não conseguiu entender. Como é que uma Igreja exclui uma criança? Que Deus é que serve essa Igreja? Que doutrina pratica a Assembléia de Deus de Lucas do Rio Verde? Nunca soube, nem conheceu qual o Pastor que dirigia esta, mas gostaria de ouvir dele, a explicação sobre tamanha afronta a Deus, excluir da Casa de Deus uma criança.

Caxito não podia aceitar aquele comportamento. Não era a Assembléia de Deus a estar em causa, mas sim um dos seus pastores e alguns dos seus fiéis discípulos que apenas se diziam seguidores de Jesus, mas se este voltasse nesse momento e procedesse ao tal juízo anunciado na Bíblia os condenaria de imediato, sem apelo, nem agravo. Totalmente diferente da Benção, do amor por Cristo e da fraternidade que encontrara na mesmíssima Assembléia de Deus em Goiânia, a do Pastor Baloy, esse sim, seria arrebatado por Jesus e subiria aos céus. Tal ocorrência contribuiu para confirmar o pensamento de Caxito sobre as Igrejas e Deus. O importante era estar na Graça de Deus, é praticar o bem, ser solidário, coerente, ter caráter, viver com honra e humildade e Jesus não o condenará. Não há uma igreja melhor ou pior. Há sim, membros de todas elas que não seguem o que apregoam. Pastores que metem o dinheiro dos fiéis ao bolso, em proveito próprio, crentes que são capazes das atitudes mais vis, para ficar por cima do seu irmão, tal como foram os seres humanos, com os mesmos defeitos, com o mesmo egoísmo, mas com muito mais poder que escreveram as páginas negras da Santa Inquisição, uma vergonha para os verdadeiros católicos. E como é condenável a complacência com que o atual Papa católico, Bento dezesseis, pactuou com padres pedófilos e tudo fez para apagar e esconder a verdade, servindo-se da sua influência para tentar dar a tais abomináveis criaturas que se dizem seguidoras de Deus, mas que hão de arder nos quintos dos infernos para pagar as atrocidades cometidas contra crianças inocentes, assim como seu Bento dezesseis lhes irá fazer companhia por defendê-los e arderá no mesmo fogo. Não se culpem, pois as organizações e as igrejas, mas os maus crentes e os maus fiéis. Haja humildade em reconhecer tais fraquezas, tanto de um lado como do outro.

Voltando a Matthew, reconheça-se que ele sofre realmente de déficit comportamental e em especial, déficit de atenção. E esse problema só se tem agravado com as constantes mudanças a que tem sido sujeito. Da mãe, para o pai, do pai para a mãe, jogado de lado para lado. Só contribuiu para mais acicatar o seu déficit de atenção. As constantes mentiras, o pegar em dinheiro ou outros pertences dos outros, são uma forma de chamar a atenção. Caxito e Adélia chegaram a conversar com a psicóloga indicada pela escola para trabalhar com Matthew. E como educador, embora habituado a trabalhar com outro tipo de crianças problemáticas, com exceção de um ou outro caso do tipo de Matthew, tentou começar a trabalhar com ele, mas os acontecimentos precipitaram-se e tudo se complicou.

É preciso que se reconheça que Matthew é muito mais vítima que mal comportado. O seu relacionamento com os filhos do companheiro de sua mãe foi desde logo muito problemático e não só por culpa dele. Da outra parte tudo foi feito para correr com ele, um elemento indesejável, tal como sua mãe, responsabilizada pelo fracasso do casamento do pai, com a mãe deles. Uma idéia errada que todos os filhos sabem que é errada, mas que sempre tendem a abraçar para amenizar sua frustração pela desagregação familiar e separação dos pais. O ser humano tende a arranjar um culpado, mesmo que o não haja.

Logo que Caxito e Adélia conseguiram o aluguer de uma casa e se instalaram na sua residência, Tavinho, dois ou três dias depois, surgiu com o argumento que a situação familiar não ia bem e tinha reunido a família haviam chegado a um acordo e empenhamento de todos com regras a serem estabelecidas e que teriam de contribuir, restando a alternativa para quem as não cumprisse, sair de casa. Só havia um problema. Matthew! Ele não conseguia cumpri as regras e por isso, havia duas possibilidades, ou Adélia e Caxito se dispunham a acolhê-lo em sua casa ou seria remetido para o pai dele no Recife. Mais um erro. Matthew voltava a ser descartado. Acabou por ficar com o casal. E isso provava a falsidade da tal reunião familiar. Ao Matthew não foi dada a oportunidade de cumprir, ou não, as tais regras, descartaram-no antes e esse sempre fora o objetivo. Não era a solução que haviam pensado. Planearam dar o seu apoio, mas com ele a viver com sua mãe. Até porque seria mais fácil de controlar as iniciativas para recuperá-lo. Acresce que Matthew é muito inteligente e, tirando o seu problema de deficit comportamental, perfeitamente normal.

Não resultou. E se Jesus voltasse à Terra e passasse naquele momento por Lucas do Rio Verde, haveria de se dirigir aos envolvidos e repetir a frase que um dia repetiu noutras circunstâncias e perante problemática diversa; quem não pecou que atire a primeira pedra.

Falhou o Caxito, porque não teve sensibilidade ou capacidade de contornar todos os problemas. Falhou sua mãe, pois não lhe deu a atenção devida e quando Caxito lhe pretendeu aplicar alguns castigos, privando-o de algo que ele gostasse para ver se entendia que para gozar daquilo que mais gostava teria de ser merecedor e cumprir determinadas regras, comuns a todos nós que vivemos em sociedade. Falhou o companheiro de sua mãe, pois pressionou esta a afastar Matthew, para que pudesse haver paz familiar. Falhou sua avó, Adélia, pois seu coração falou mais alto e não cumpriu as restrições impostas por Caxito, como medida corretiva e também teimou em não administrar a Matthew medicamento receitado pelo médico, com o argumento de que o fazia apático, estar sempre com sono e ele; segundo ela, não precisava de remédios. Falharam os filhos de Tavinho, desejosos de se descartarem dele e com o plano delineado e assente em prioridades. Primeiro, descartar Matthew, a seguir, descartar sua mãe, removendo ambos da vida se seu pai.

E feita a auto-análise a seus corações, todos concluiriam que não podiam atirar a primeira pedra. Matthew acabou regressando a casa do pai, no Recife. E para Caxito e Adélia, deixou de fazer sentido continuarem a viver em Lucas do Rio Verde, onde apenas perderam tempo e dinheiro. Mas onde também houve fatores positivos. Pese embora todos os contratempos e atribulações, Lucas do Rio Verde possuía Academia de Ar Livre e com alguma dificuldade, muita paciência e insistência, por parte de Caxito, Adélia lá foi fazendo algum exercício e El Diaba via seus ataques terem menos impacto e o nível de glicose voltar a situar-se abaixo dos duzentos.



publicado por coracando às 23:45
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